O valor de uma amizade é algo que cai em banalização na sociedade atual. Costuma-se chamar de amigo ou de amiga a qualquer pessoa que faz parte de um relacionamento. Todavia, amizade constitui uma essência muito mais profunda do que simplesmente encontros esporádicos ou mesmo frequentes para se tratar de diversões. Uma verdadeira amizade pode ser traduzida em sentimentos e atitudes que conduzem à libertação de prisões emocionais, físicas e espirituais.

Ao derrotar o guerreiro filisteu, Golias, o menino Davi, já ungido rei de Israel e companheiro de confiança do rei Saul, muito apreciado por ele por acalmá-lo com sua cítara em seus ataques de fúria, passou a ser visto com outros olhos por todo Israel. Logo após o grande feito, as mulheres de Israel cantavam: “Saul matou mil, mas Davi matou dez mil”. Tal cântico provocou a ira de Saul contra seu fiel companheiro Davi. Esta ira fez com que Saul iniciasse uma perseguição contra Davi com intenção de matá-lo. Davi não teve outra alternativa a não ser a fuga.

Em meio a esta situação tão grave, Davi não deixou de contar com a amizade de Jônata, filho de Saul. Mesmo sendo filho do rei, este não ficou ao lado do pai em sua crise de loucura, mas manteve-se fiel ao seu amigo. Em nome de sua amizade, comprometeu-se a avisar Davi do risco que corria se permanecesse na região e avisou-lhe da necessidade de ir embora. Graças à intervenção de Jônata, Davi não perdeu sua vida. Esta intervenção não foi tarefa fácil, pois ele estava desafiando uma dupla autoridade: a do rei e a de seu próprio pai. Todavia, Jônata sentia que a amizade que o ligava a Davi clamava por justiça e esta justiça era comprometida com a vida e não com planos mesquinhos de morte.

Neste mundo pós-moderno em que vivemos, precisamos nos perguntar se nosso sentimento de amizade realmente está comprometido com a vida. Precisamos saber se ele está disposto a passar por cima de questões desafiadoras que ferem a moral e a dignidade humana. Precisamos saber se este sentimento semeia em nós a coragem que semeou em Jônata, tornando-o capaz de desafiar o poder vigente para salvar a vida de seu amigo, afinal, sabia ele, a integridade da pessoa é bem superior do que as redes de leis, títulos e honrarias que ao longo do tempo vamos criando para dizer para a sociedade que somos alguém, para dizer que temos importância, para obter o reconhecimento das pessoas. Jônata sabia muito bem que nada disso tinha serventia diante de uma verdadeira amizade.

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